ESTÉTICA DO PERIGO






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Bolhas de álcool prestes a explodir
Violinos desgovernados
Neve cintilante
O fim







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A Dyonisos, a Afrodite
& aos demais deuses que entraram comigo
na grande caçada







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ESTÉTICA DO PERIGO


1.
O cenário:
Tensões, torções
Um bloco solitário
De risco
Jogos de perigo

Semi-deus de acção devastadora,
Vigoroso criador de
Auge estético


2.
A verdadeira criação é corajosa;
Brusco rompimento,
Excessiva afirmação de força

Terrível compromisso com o fulgor do devir,
Com o ardente perigo do movimento
-Um tornado, muito para lá
Das éticas de paralisia


3.
Não há trovão aos soluços,
Ou relâmpago submetido
A lei ou a moral

A tempestade arrasa
Impetuosa


4.
Vivemos em
Terríveis confrontos

(Rixa de lacraus)

Um escalpe
Estética do perigo


5.
Animal de súbito
VIVO

Ameaçador cortejo de escorpiões
Sob a cortante expressão
Do pôr-do-sol


6.
Botas de vísceras alucinadas
Braço de estrada escura

Assassino aguardando
Sombras desenquadradas

Vibrando violentas memórias

Caminhando (a luz de um
Sentido interior luzindo)
Para um imprevisível fim

Urso industrial
Garra de sangue estranho
Voa ao ritmo
De uma lâmina/trespasse


7.
Trovão sem tábua
Passo sem ordem
Explosão sem mandamento


8.
Nas chamas sucumbem
Todas as tábuas;
As chamas VALEM
Pelo seu poder
& intensidade

Um azul determinando gestos,
Um verde bélico
Disparando atitudes

O Sol não ora;
Queima

Cria

Quer


9.
Negro luminoso novo sol,
Ébrio, imprevisível,
Alheado de leis &
Sempre pronto a explodir


10.
Insultos à base
& insultos ao topo

Dilaceração brusca
De ídolos & alicerces


11.
Um escalpe
Estética do perigo





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FOSFORO BRAVIO


1.
O meu tempo é o da devastação das estações;
Retorno em ímpeto febril à neve invernil,
Regresso em força ao terrível ardor de verão

Danço, com alguma fúria,
Ao longo do ciclo
De inéditas criações


2.
Amante de extremos, incêndios & tigres,
Abraço o informe & o arbitrário,
A rasgante melodia do devir


3.
Solidão- que amor por este abismo!
O azul gélido de altas montanhas,
O silêncio alegrando o pensamento!
Escarpada profunda- tão longe
Do homem!- tão perto dos deuses…

(por vezes avisto um deus,
Por vezes unicamente encontro
Olhos enfurecidos de panteras…)


4.
Só me interessa o extremo,
A ruptura mítica

Expulsar o perigoso fósforo bravio
Que se impacienta no interior da carne

Viver o assombro do fogo
& as pétalas de gelo surgidas
Nos jardins da alucinação





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OLHOS DE FELINO


1.
Nos pórticos flameja o sangue de nossa entrega

(Olhos de felino numa
Púrpura noite de força)


2.
Partimos através de uma explosão,
Incontidos trovadores marginais,
Esbanjando energia inesgotável

Embriagados em cânticos
Devastadores…
(Primeiro eram rugidos;
Só depois bizarros sons destruíram
Essas doces entoações de luz)


3.
Libertar a acção  a criação
Dos anões reactivos do mundo





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SILÊNCIO DE FEBRE


1.
O mar
Perfurantes fluídos
Sem promessas

O vento


2.
É sangrenta nossa loucura,
Terrível,
Febril

Amantes de dilúvios,
No interior do
Poker dos mundos


3.
O rio ainda corre,
Rouco de cansaço

& suas belas inquietas ramificações
Buscando um par de olhos tomados pelo brilho
Que unifique seus rasgados fragmentos


4.
O azul  o verde
& o perigo

Estar só sob
Um ofegante sol

Estar só sobre
O silêncio das areias

- Mudas,
Que tudo possuem
No seu sem-tempo


5.
Mar
A leveza de tudo ser
& o nada que devora
Nosso impulso


6.
Oh,
Pântano onde algo tece
Nosso contínuo complexo
Murmúrio de insecto

Febril, terrível,
Em sangue,
Nossa loucura

As chamas do sol
Em pânico


7.
O mar
Batalhas antigas, esquecidas,
Mas que cada nova concha
Devolve da escuridão,
Como uma estranha certeza


8.
& era agora que tua mão me embalava,
No doce êxtase de podermos
Conduzirmo-nos um ao outro

Tremem músculos
Que antes dançavam

Só- o azul- o mar
O teu rosto
Aquela loucura

& os trespasses no ritmo,
Como lâminas inomináveis
De feridas irreversíveis


9.
Amei o condor que um dia passou,
Rápido como o fogo a quem sacrifiquei;
Mas devoram-se cascavéis
Neste ocaso desesperado





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ASSOMBRO SÚBITO


1.
Assombro súbito

Estaríamos no vapor de mar incerto?
Na perigosa palavra do vidente?
Na neve roxa de vulcões extintos?
Na possível promessa
De teu indecifrável sorriso?

Atónita flutuação
Nos invisíveis labirintos
Que enevoam o instante


2.
Viajando, perplexos,
Pelos corredores do absurdo

& desejando voar

Atracar em sol &
Em astros nocturnos

Agrilhoados no sonho
De um louco atormentado





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SUAVE LUZ DE LINCE


I

1.
Que lavas de deslizante deleite jorram,
Sem parar, de teu sorriso de entrega
& promessa de morte eléctrica?

2.
Aplacarás pois tu
A terrível maldição
Dos negros vazios?


3.
Amor azul
(Estrepitosos suaves gritos de seda
Que arde dentro & fora do teu vulcão)


4.
Tu ardes, plena magia
Em meu pleno deserto

Seda acesa,
Melodia que trespassa




II

1.
Tu própria:
     cristal, néon,
     rosa, maré


2.
Luz verde dos teus olhos
- Posso finalmente partir
(Acolhe-me no luxo
De teu fogo marginal)


3.
Tu, olhos que ardem & tremem
Na insegura tensão da carne,
Tentas sondar-me?


4.
Arde por mim
     em mim
Na noite que brilha
     com tua voz

Voa comigo,
Sorrindo na
Minha asa

(Só meus sonhos insanos poderiam trazer-te
À luz de uma existência fatalmente distante)


5.
Amarias as histórias que eu te traria,
Sempre novas & vivas,
Como a junção dos elementos
Na melodia do teu sorriso

Respirar teus lábios de prata índia
& mergulhar em nosso voo sem fim




III

1.
Anjo do poente,
Arderás tu no meu voo?


2.
Onde te encontrar,
Senão num impulso de
A-reflexivo rodopio?


3.
Há algo em ti
A que algo em mim
Ora- estarei perdido?


4.
Algo invisível me persegue:
- Tu própria, gravada em febre


5.
Porque ficam vibrações do teu odor
- Prata, fragmentos de sol-
Que subitamente emergem
De meus poços & lagos em convulsão?


6.
Tua transparente cerrada névoa
De perfume de carne & desconforto
- Enérgica vertigem de tudo




IV

1.
Tua pele explode pura
Em meus dedos que reluzem

Devorar teu
Escarlate fruto de curva


Eu-louco
& a dama que vibra,
Sangrando prazer
Nos fósforos da carne


2.
Rapariga de luz de lince

Teus passos suaves pelos rochedos do mar imenso,
Lá onde os deuses dançavam em orgias anciãs

Nua, perfeita,
Os teus movimentos ecoando harmónicos
Como promessas plenamente absorvidas
Pelos meus faiscantes sentidos incendiados

(Possuir-te segundos antes
Do desabamento do mundo)





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ÁSPERO NEGRUME DE LOBO


1.
Nos teus olhos encontro velas ardentes,
Gatos-lagartos em luxuriantes desfiles,
& reluzentes mitologias estendidas
Na luminosa desmesura do firmamento

(Trovão atraiçoando
A limpidez da visão)

Ela dança na minha
Esquartejada memória,
Altiva raínha desfigurada
Num sonho de azul macio


2.
Tuas jóias & minha febre
Eram vertigem

Enlaçava-nos o fogo,
Na dança

Devorava em transe
Os mitos que criava
Em ti

(Tu não existias;
&, no entanto,
Era eu que vivia
Nos teus sonhos)


3.
Dama incerta de
Garras-promessas
Em vértices-ecos

Que ocultam os exércitos que suas,
Pulverizando sageza em
Perturbante ápice rasgante?


4.
O jardim armadilhado
Flores d’Amantes-Feras
Enlouquecidas

Pluralismo brutal
De centro que reza
Impunidade

Melodia & absorção
A terra brotando
Néon

& por fim asfixiados pelo fogo
Num estranho ocaso de lua





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